TOMO I
“Quem me criou foi o tempo, foi o ar. Ninguém me criou. Aprendi como as galinhas, ciscando, o que não me fazia sofrer eu achava bom.” Esta declaração da própria Dercy Gonçalves é a única referência sobre sua verdadeira origem, supondo-se que seja confiável, uma vez que ela é mais velha do que a própria idéia de registrar a vida de alguém.
Dercy Palpatine Ramsés Tutankhamon Windsor Abravanel Marinho Castro Orleães e Bragança de Éden Gonçalves tem o poder da imortalidade e antigüidade, conhecendo toda a história do universo, visto que ela a presenciou. Possui também o dom de xingar 4 mil palavrões em 30 segundos, permitindo-lhe deixar seus inimigos com a auto-estima lá embaixo. Alimenta-se exclusivamente de ambrosia e néctar. Sua única limitação física é uma ligeira dificuldade auditiva, adquirida por ter ouvido um grande barulho, que depois ela soube tratar-se do Big Bang. Na ocasião, ela tentou gritar mais alto, mandando o responsável SE FUDER NA CASA DO CARALHO!
Das muitas coisas passadas e escritas, dos infinitos horrores deste mundo, é dito que Ela, A dos Muitos Nomes, Mãe de Mil Abominações, Aquela cuja Boca é a Cloaca do Mundo, A Morta que Não Morre, cujo nome conhecido torna loucos aqueles que o proferem, Dercy da Boca Imunda, proferiu a primeira palavra, PORRA, e começou a parir sua progênie medonha num tempo antes do tempo.
Foi a pioneira na taxonomia dos órgãos sexuais, tendo orientado a primeira cópula entre Adão e Eva. Como sua esposa andava se engraçando com uma certa serpente, Adão decidiu conhecer Dercy no sentido bíblico. Dessa relação nasceram Nod e todos os habitantes da terra de Nod, os Homens que Dizem Ni e os Lumpa-Lumpas. Assim, Caim poderia povoar a terra algum tempo depois sem precisar cometer incesto. Séculos mais tarde, Dercy namorou um dos descendentes de Adão, Matusalém, o moço.
Como ainda não conhecia o real alcance de seu maior poder, a imortalidade, Dercy temeu morrer afogada no dilúvio, e pediu a Noé para entrar na arca. Mas a Avó da Neta, que ajudou Noé a separar os casais de animais que seriam salvos, há séculos tinha uma rixa com Dercy, pois contestava o título de ser vivente mais antigo do planeta, e não a deixou embarcar. Dercy mandou-a TOMAR NO CU e salvou-se em uma jangada, pois ela sabia muito bem com quantos paus se fazia. Foi parar numa grande ilha que batizou de Atlântida, que milênios mais tarde lhe inspiraria a criar uma indústria cinematográfica brasileira.
Acreditava-se que ela era a mãe do primeiro highlander a colocar os pés neste mundo, e que a única forma de derrotá-la seria cortando a sua cabeça e jogando-a no fogo da perdição de Sauron. Com o passar dos séculos, após pararem de se enfrentar eternamente na esperança de se matarem (mesmo sendo imortais) e analisarem sua situação, os highlanders perceberam que o destino de cada um estava feito, e a profecia, cumprida: só haveria um. No caso, uma. Entretanto, um grupo dissidente tentou se unir para matar Dercy, achando que ela fosse mesmo um deles. Ao tentarem, falharam, pois suas espadas não a feriam: Dercy nascera antes das leis da física, e sua composição química repelia qualquer matéria ou energia, por serem coisas muito modernas se comparadas à sua pele.
Com Satã Goss, que tinha o poder de enfurecer os seres e transformá-los em monstros incontroláveis, Dercy pariu Darth Vader. Em seguida, mandou construir a Estrela da Morte e se tornou o Imperador, sendo muitos milênios depois destronada pelos Jedi, e indo refugiar-se em uma pirâmide no Terceiro Mundo, onde permaneceu outros tantos milênios até ser acordada por Escamoso, Simiano e Chacal. Para puni-los, invocava os espíritos do mal que transformavam aquela forma decadente em Mumm-Ra, o Ser Eterno. Mas o encantamento não era duradouro e ela logo voltava à velha forma.
Dirigiu-se então ao recém fundado Egito, onde inspirou a técnica da mumificação, tendo servido de modelo por várias dinastias, e partilhado da cama de todos os faraós, inclusive da faraona Hatshepsut, a barbada. Sua fama correu o mundo e logo foi convidada à corte do rei Nabucodonosor, para dirigir a mais famosa casa de massagens da Babilônia, que lhe deu fama de cafetina. Mas Dercy começou a ter vertigens com aqueles jardins suspensos, que eram altos pra CARALHO, e mandou o rei Nabuco tomar NABUCO dele.
Na Atenas de Péricles, Dercy iniciou sua carreira artística, atuando em Antígona, de Sófocles. “Não é antigona, PORRA!”, dizia nas entrevistas na Ágora. Recusou o papel-título de “Lisístrata ou A Greve do Sexo”, de Aristófanes, por ser contra seus princípios, o que lhe levou ao ostracismo.
Retornou ao Egito, envolvendo-se em novas polêmicas amorosas. Sua maior rival foi a rainha Cléo, pois esta ganhou os corações dos generais romanos Júlio César Cardematori e Marco Antonio. Dercy nunca a perdoou por isso e, disfarçada de empregada, entregou à sua rival um cesto cheio de cobras venenosas, dizendo serem morangos silvestres da Babilônia, causando a sua suposta morte, fato este controverso.
Para escapar da prisão perpétua, o que seria um martírio infinito, refugiou-se em sua pirâmide, ressurgindo séculos depois na corte de Elizabeth I da Inglaterra, onde foi ama de leite das jovens Rainha Vitória, Rainha Mãe e Rainha Elizabeth II, mulheres de saúde frágil que não viveriam muito.
Depois de muitos séculos fora dos palcos, Dercy retomou a carreira de atriz, participando da inauguração do Moulin Rouge, em Paris. Lá conheceu um de seus mais ilustres amantes, D. Pedro II, ex-Imperador do Brasil, aquele que era mais velho do que o pai. Mas quem foi rei nunca perde a majestade, e ele era muito apegado a uma coroa. Não sobreviveu muito tempo, o que deixou Dercy entristecida.
Depois de um porre de absinto, Dercy acordou na cama dos irmãos Lumière. Eles acabaram inventando o cinematógrafo a seu pedido, porque ela queria muito rever as cenas de sexo ardente que fazia com eles. Dessa relação nasceu Olivia de Havilland, que cedo foi morar em Hollywood, mudando-se depois para a Geórgia, onde se uniu aos confederados.
Por ser uma precursora do cinema, Dercy recebeu alguns convites naquela época de ouro. No início fez figuração em filmes como “Tempos Modernos”, de Charles Chaplin (filme do qual, segundo rumores, correu o risco de ser afastada várias vezes por sua inaptidão para o cinema-mudo) e, mais tarde, ao alcançar o estrelato, protagonizou blockbusters como “A Múmia” e a seqüência “O Retorno da Múmia”, “A Noiva de Frankenstein” e “A Noiva Cadáver”, além de ter feito ponta como a mãe de Ben Hur, alcançando grande sucesso. Infelizmente, não demorou muito para que a fama subisse à sua cabeça e para que ela mandasse Hollywood inteira pra PUTA QUE O PARIU, deixando alguns executivos estupefatos e encerrando de vez sua carreira no cinema internacional.
Jogada na sarjeta, Dercy foi encontrada por um de seus maiores fãs, Santos Dumont, que a convidou para ser aeromoça do 14-Bis (apesar da contradição do termo). Assim, ela chegou ao Brasil no início do século XX, indo parar na cidade de Santa Maria Madalena, RJ, onde, com a ajuda de Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, forjou uma certidão de nascimento, com a data de 23 de junho de 1907 e o nome de Dolores Gonçalves Costa, para regularizar sua situação jurídica.
Em seguida, Dercy e Macunaíma decidiram impulsionar as artes no Brasil, e inventaram a Semana de Arte Moderna, o movimento antropofágico (onde todo mundo comia todo mundo), o teatro de revista, a pornochanchada, a radionovela e a dança do maxixe (um homem no meio com duas mulheres fazendo sanduíche). Como a essa altura já não tinha mais nenhum descendente vivo, exceção feita a Olivia de Havilland, Dercy resolveu procurar seres tão antigos quanto ela, que pudessem lhe dar filhos para povoar a televisão brasileira, que ela pretendia criar. Repórter Esso, testemunha ocular da história...
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